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Sinopse:

Ao ar livre um grupo de mulheres ocupa-se da tecelagem de panos e de outras tarefas associadas como a fiação de algodão.

Contextualização:

Tecer é Produzir Moeda

Em Timor tecer é antes de mais «cunhar» moeda; os tecidos saídos dos teares não são destinados prioritariamente a ser usados, excepto se já gastos ou aquando de certas cerimónias implicando o indivíduo, a linhagem, o grupo no seu conjunto: apresentação do recém-nascido, casamento, enterro, adopção, inauguração de casa.

Os tecidos que circulam na sociedade em troca de outros bens segundo regras precisas, pertencem de facto ao património da linhagem que acolhe a mulher por casamento. A tecelagem, actividade feminina, é muito valorizada pelos membros masculinos (e femininos) de cada grupo, inteiramente conscientes da importância de tais produtos para as relações sociais e económicas assegurando a sobrevivência da linhagem e do grupo.”in Povos de Timor, Povo de Timor: vida, aliança, morte(Cfr. Bib.)

[Têxteis]

“Os Timorenses (…) praticam a indústria do algodão – a única fibra têxtil que actualmente manufacturam para a confecção das suas vestimentas. Desde há muitos anos que a cultura do algodão foi introduzidaem Timor Português. O terreno é extraordinariamente propício, mas a variedade de fibra mais utilizada, espontânea e de qualidade inferior não tem importância de maior na economia da província. Cabe aos homens preparar a terra e fazer a sementeira do algodão, incumbindo às mulheres a colheita, o descaroçamento, a fiação, a tingidura e a tecelagem do produto. Para tingi-lo as mulheres cultivam nas hortas plantas tintoriais ou utilizam raízes, cascas e folhas de algumas árvores do mato; os teares de tipo horizontal, são pequenos e muito rudimentares. Com o fio do algodão e o tear as mulheres fabricam panos de diferentes qualidades: grosseiros, simples ou de diversas cores, ostentando estes últimos interessantes desenhos geométricos, estilizações de pessoas e de animais e outros motivos artísticos que os tornam muito apreciados, nomeadamente os que contêm retrós e as finas linhas de Macáçar (Celebes) – mercadorias estas que muito têm concorrido para o esmorecimento da cultura do algodão em Timor. Atecelagem, tão florescente em passado não distante – o vestuário dos homens e das mulheres era feito quase exclusivamente de panos de algodão regional -, está em decadência por virtude da importação cada vez maior de tecidos desta fibra.

A indumentária nativa compõe-se dos típicos panos grossos outaísse – o taísse-mane para o homem e o taísse-fetó ou sarão para a mulher -, descendo em regra naquele da cintura até aos joelhos ou ao terço inferior das pernas, e nas mulheres do peito até aos tornozelos; em nossos dias, o taísse vai sendo substituído pela lipa, pano largo riscado, de algodão, colorido de azul, encarnado ou verde, fabricado fora de Timor. Entre os homens, a calça e o calção começam a usar-se em vez da lipa, ou associados a esta, e nas mulheres generaliza-se o uso do cambátique, tecido pintado ou estampado, de proveniência estrangeira, com motivos adaptados ao gosto timorense. A cobrir o busto, ambos os sexos envergam cabaias de algodão, de corte e molde chineses; as das mulheres são de melhor qualidade e correntemente de seda e de cambraia com guarnições de renda. Os homens estão a substituir as cabaias pelas camisas e camisolas e as mulheres já se habituaram às combinações. Outra peça de vestuário, escolhida com grande esmero, é um taísse,lipa ou cambátique com que se agasalham; porém, a manta de algodão importada começa a tomar o lugar daqueles. As vestes feitas de tecidos de cascas de árvore batidas e as folhas de palmeira desapareceram com a indústria do algodão. As mulheres ostentam frequentemente faixas para segurarem os panos nos quadris, tecidas de linhas de algodão regional e vistosas franjas; as cintas dos homens são maiores, geralmente brancas, amarradas com certa elegância à cintura, estando já muito vulgarizados os cintos de cabedal, de elástico e de nylon. Os panos timorenses são o orgulho das mulheres que os fabricam e a vaidade dos homens que os envergam nas festas e em grandes cerimónias.

As folhas verdes de sisal são industrializadas por métodos muito primários: batendo-as com um bambu e esfregando-as com uma pedra para retirar-lhes a cutícula e a polpa exterior, reduzem-se a fios que, depois de secos, se empregam no fabrico de cordas, passadeiras, tapetes e outros objectos de uso doméstico.” Almeida, António de “Notas sobre artes e ofícios de nativos de Timor Português” (Cfr. Bib.)

Bibliografia:

Almeida, António de “Notas sobre artes e ofícios de nativos de Timor Português”, Revista Garcia de Orta, Vol. 7, nº3, Lisboa, 1959.

Cinatti, Ruy, Motivos Artísticos Timorenses e a Sua Integração. Lisboa: IICT/Museu de Etnologia, 1987.

Cinatti, Ruy; Almeida, Leopoldo de; Mendes, Sousa, Arquitectura Timorense. Lisboa: IICT/Museu de Etnologia, 1987.

Campagnolo, Henri; Lameiras-Campagnolo, Maria Olímpia; Pereira, Benjamim; Oliveira, Ernesto Veiga de - Povos de Timor, Povo de Timor: vida, aliança, morte. Lisboa: Fundação Oriente; IICT, 1992. (Catálogo de exposição, Museu de Etnologia, 1989)

Sobre Missões Antropobiológicas e António de Almeida consultar: http://www2.iict.pt/?idc=102&idi=12300, http://www2.iict.pt/index.php?idc=102&idi=12153

Sobre Timor consultar

Blogue História Lusófona

António de Almeida e a Missão Antropológica de Timor

 António de Almeida e a Missão Antropológica de Timor


Maria Cristina Neto 
Vítor Rosado Marques

 


O Professor António de Almeida (1900-1984) foi membro da Junta das Missões Geográficas e de Investigação do Ultramar, posteriormente denominada Junta de Investigações do Ultramar e, a partir de 1982, Instituto de Investigação Científica Tropical, e Director do Centro de Estudos de Etnologia do Ultramar, denominado, a partir de 1962, Centro de Estudos de Antropobiologia. 
Iniciou as investigações antropológicas em 1934, em Angola, onde também esteve entre 1948 e 1950, quando assumiu a chefia da Missão Antropológica de Angola. Posteriormente, realizou mais duas campanhas, em 1952 e em 1955. 
Os seus estudos antropológicos abrangeram, igualmente, outras antigas colónias, como: Guiné (1959 e 1962), Cabo Verde (1962), S. Tomé e Príncipe (1954), Moçambique (1959), Índia Portuguesa (1960 e 1961), Macau (1966) e Timor. No âmbito das Missões e Campanhas Antropológicas em que participou, observou mais de 4.000 angolanos e cerca de 3.000 timorenses, para além de 300 santomenses e 50 chineses de Macau, sendo entre 1950 e 1955 o período de maior actividade das missões que chefiou. 
O “corpo” das equipas que constituíam as missões antropológicas era formado por 3 ou 4 elementos, formados em Portugal. Quando na região em estudo, eram auxiliados por elementos locais que colaboravam como intérpretes, como “informantes” ou de diversas outras maneiras. Alguns funcionários administrativos que exerciam cargos nas colónias (muitos deles ex-alunos do Professor António de Almeida na Escola Superior Colonial de Lisboa ou no Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina) colaboravam na recolha dos dados e informações diversas, mesmo quando os investigadores directamente ligados às missões se encontravam em Portugal. Estas missões permitiram coligir muito material etnográfico para o futuro Museu de Etnologia e para o Museu da Sociedade de Geografia de Lisboa.
Como chefe de Missão Antropológica de Timor (a partir de 1953), trabalhou nas várias campanhas, em conjunto com Mendes Corrêa e Ruy Cinatti, assim como com notáveis investigadores estrangeiros, como Abbé Henri Breuil, E. O. J. Westphal e Georges Zbyszewski, investigador radicado em Portugal e geólogo dos Serviços Geológicos de Portugal.
António de Almeida realizou diversas deslocações a Timor, onde permaneceu por períodos mais ou menos longos como Investigador, como Professor ou como deputado à Assembleia Nacional por aquele território (1953, 1954, 1957, 1963, 1964, 1966, 1968, 1969 e, já após a sua jubilação, em 1974 e 1975), aproveitando sempre a oportunidade para recolher informações e dados para a sua investigação antropológica. Apresentando os timorenses uma enorme heterogeneidade morfológica, a que se juntava uma notável diversidade cultural, muito rica do ponto de vista linguístico e da cultura material, este povo tornou-se num objecto ideal de estudo para o regime colonial da época. 
A Missão Antropológica de Timor tinha como objectivo a construção da “Carta Etnolinguística de Timor”. Esta carta, que pensamos não ter sido terminada, englobava diversas matérias, entre as quais a Pré-História, a Linguística, a Toponímia, a Antroponímia, a Etnobotânica e a Etnozoologia, a Etnologia e a Antropologia Biológica. 
No âmbito deste ambicioso trabalho, António de Almeida registou dezenas de características anatómicas e fisiológicas dos naturais, elaborou mapas e registou costumes e técnicas tradicionais, quer sob a forma de registos escritos, quer sob a forma de registos audiovisuais e fotográficos. 
As técnicas audiovisuais foram, frequentemente, utilizadas para registar as músicas e os cantares, bem como as danças e trajes tradicionais ligados a manifestações (estilos) rituais, cerimónias tradicionais, onde são retratados episódios do quotidiano, ou onde é evocado o espírito do povo timorense. 
Este material constitui hoje um valioso espólio, cuja pertinência é indiscutível, quer para a compreensão da História de Timor, quer como instrumento de estudo da Antropologia Colonial Portuguesa e que está a ser alvo de um estudo multidisciplinar por parte de investigadores do IICT, tendo sido já apresentados alguns filmes em mostras de cinema. 
Do mesmo modo, o estudo da variedade de línguas do povo timorense resultou num elevado número de gravações sonoras de entrevistas que António de Almeida realizou com timorenses, em diversas regiões do território. 
Queremos, ainda, apresentar uma sinopse das pesquisas arqueológicas realizadas no âmbito da Missão Antropológica de Timor, pelo Professor António de Almeida e pelos investigadores que com ele colaboraram (Mendes Corrêa, Ruy Cinatti, Camarate França, Georges Zbyszewski, Mª Emília Castro e Almeida e Mª Cristina Neto). 
Foram identificadas e estudadas várias estações do Paleolítico Antigo Médio e Superior e do Mesolítico, como Laga, Baguia, Maliana, Suai, Ainaro, Viqueque e a gruta Léne Hára, algumas delas de colaboração com Abbé Henri Breuil e Georges Zbyszewski. Durante estas missões, foram descobertas pinturas rupestres com representações de figuras humanas e animais, consideradas do Neolítico, embora H. R. Van Heekeren (1972), arqueólogo holandês, as situe, ainda, no Mesolítico. A interpretação simbólica ligava-as à protecção contra os espíritos malignos, através dos antepassados.Em 1962, Ruy Cinatti observou as primeiras pinturas rupestres das escarpas de Tutuala, em Íli Kére Kére, e da gruta de Léne Hara. As pinturas de Tutuala representavam desenhos estelares e círculos raiados ou solares ou figuras antropomórficas representando os antepassados em cenas de luta ou de invocação dos espíritos. É também possível observar uma embarcação (barco de transporte de mortos e de antepassados) semelhante às que se vêem no cume das habitações típicas da parte leste da ilha de Timor. Entre 1963 e 1964, António de Almeida estudou as pinturas situadas na escarpa de Suno Taraléu (igualmente na região de Tutuala). Os desenhos, com motivos semelhantes aos de Íli Kére Kére, tinham um forte poder mágico para os naturais, de tal modo que ninguém ousava tocar nas pinturas, com medo de adoecer ou morrer.Os materiais líticos estudados por um de nós (Mª Cristina Neto, de colaboração com Georges Zbyszewski e Mª Emília Castro e Almeida) levam-nos, pela suas características, a classificá-los como do Paleolítico Superior e mesmo posteriores.A cronologia das indústrias e das pinturas exigirão, a nosso ver, uma revisão séria, porque poderemos estar perante realizações mais modernas, como aliás é sugerido em trabalhos mais recentes, bem como pela abalizada opinião do Professor Van Koenigswall transmitida a um dos autores deste artigo (Mª Cristina Neto). 
Muito do trabalho realizado pela Missão Antropológica de Timor deve-se ao enorme prestígio e capacidade de liderança de António de Almeida, que contou com o indiscutível apoio financeiro e logístico do Ministério do Ultramar e, mais tarde, com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian. 
BIBLIOGRAFIA 
Almeida, António, 1994 – O Oriente de Expressão Portuguesa. Fundação Oriente, Centro de Estudos Orientais, Lisboa, 745 pp.
Cinatti, Ruy, 1963 – As pinturas rupestres de Timor. Colóquio, Abril, 49-59.
Van Heekeren, H. R. 1972 – The Stone Age of Indonesia. Second Revised Edition. The Hague-Martimes Nijhoff. 

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Foto 1. Prof. António de Almeida e vários elementos da equipa da Missão Antropológica de Timor a bordo do D. Aleixo - 1954

 

 

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Foto 2. Timor - Baucau, Prof. A. Almeida, Dr. Almeida Gomes, Prof. Mendes Corrêa e Administrador Amaral. (da esquerda para a direita).

 

 

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Fig. 1. Mapa Arqueológico

       

 

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Foto 3. Gassi-Liu, Lagoa de Laga, 1953. Prof. A. Almeida e Prof. Mendes Corrêa. (da esquerda para a direita).

 

 

 

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Figs. 2.  Artefactos líticos, Gruta de Lene Hara, 1953

 

 

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Foto 4. Pinturas rupestres. Escarpa de Suno Taraléu, Tutuala 1963-64

2007-05-25
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